I like cats, Indian Folk Art
Das coisas que menos esperava
num hotel de cinco estrelas
era encontrar um gato
no meu prato de torradas.
Como num dos poemas últimos de Montale,
enquanto o chá arrefecia,
foi-se afastando pelo muro do terraço
em leves e femininos passos de dança,
como o faria Nureiev se tivesse
tomado comigo o pequeno almoço.
Eugénio de Andrade, Rente ao Dizer, 2ª ed, 1992
Gatinho recém-nascido
abandonado à beira do caminho
pequeno e pulsante como un haiku
Levaram-no para casa
chamaram-lhe Bashô
poema inédito de Manuel Silva-Terra
Ilustração de May Ann Licudine
Os gatos de Lisboa
Os gatos de Lisboa são altos,
esguios bem falantes.
Sabem quase tudo de história e
um pouco de geografia.
De noite caçam gatas
e de dia companhia
entre o lixo da cidade.
Não são assim tão pardos
como dizem as histórias.
Pelo contrário, andam
engravatadinhos, ar galante e
de quem não parte uma unha.
Se lhes falarem em
sardinhas levantam
altivos os bigodes -
não são desses gatos
farruscos aos pés
das varinas. Têm classe!
Mas mostrem-lhes um
banco de jardim ao sol.
E miau.
cidade à parte
os gatos da cidade de lisboa
são raros de encontrar, discretos
milagres do langor quotidiano,
atentos na sua calma
à alheia agitação citadina.
Interessam-lhes as árvores
os pássaros e às vezes
olham os rostos das pessoas.
alguns deixam-se aproximar
gostam até de nós, de nós
que gostamos deles
e queríamos encontrá-los
mais vezes
pelos passeios e jardins
mas eles só se deixam
encontrar por acaso.
Mais gatos de Steinlen:
Théophile Alexandre Steinlen (1859-1923), pintor, ilustrador e impressor, nasceu em Lausanne, na Suiça. Em 1881 mudou-se para Paris onde trabalhou como designer têxtil. Aqui, frequentou os cafés de Montmartre, nomeadamente o famoso Le Chat Noir, onde travou conhecimento com artistas de vanguarda, como Toulouse-Lautrec e Émile Zola, integrando o seu círculo. Colaborou nos jornais Le Chat Noir e Mirliton, e ilustrou também as canções de Paul Delmet, de Richepine, e a recolha Dans la Rue, de Aristide Bruant.
Colaborou igualmente em jornais e revistas, e produziu cartazes publicitários,desenvolvendo um estilo muito próprio. A filha, Colette, escritora, e, como o pai, grande apreciadora de gatos, serviu-lhe de modelo para os cartazes de La Compagnie Française e de Le lait de la Vingeanne.
Próximo dos communistes e dos anarquistas, denunciou a pobreza, a exploração e a violência através de cartazes e de ilustrações em Le Petit Sou. Entre 1913 e 1919 produziu dezassete cartazes de guerra, expondo a insustentável miséria de soldados e civis.
Ilustrações de Gustave Doré