A Arca da Jade arranjou outra morada, para a qual exportou todos - ou quase todos - os posts e comentários que, ao longo de dez anos de actividade, aqui foram publicados.
Este é o novo endereço da Arca: http://outraarcadajade.blogs.sapo.pt/. Gostaríamos de contar com a vossa visita.
fotografia de Alexey Menschikov
The fog comes
on little cat feet.
It sits looking
over harbor and city
on silent haunches
and then moves on.
Carl Sandburg
De criança sempre gostei de canas
e roubava-as do rio
ainda verdes.
Deixava-as depois estendidas ao sol durante todo o verão
e recolhia-as, ligeiras,
como o sussurro dos mosquitos.
Quando no Inverno
os ossos estalavam de frio
e os gatos tossiam sobre o damasqueiro
corria até ao sótão
e metia as mãos no meio das canas quentes
ainda com todo aquele sol em cima.
Tonino Guerra, Mel
Gato preto sentado no gelo - foto encontrada em portugues.torange.biz/
I like cats, Indian Folk Art
Das coisas que menos esperava
num hotel de cinco estrelas
era encontrar um gato
no meu prato de torradas.
Como num dos poemas últimos de Montale,
enquanto o chá arrefecia,
foi-se afastando pelo muro do terraço
em leves e femininos passos de dança,
como o faria Nureiev se tivesse
tomado comigo o pequeno almoço.
Eugénio de Andrade, Rente ao Dizer, 2ª ed, 1992
Há um deus único e secreto
em cada gato inconcreto
governando um mundo efémero
onde estamos de passagem.
Um deus que nos hospeda
nos seus vastos aposentos
de nervos, ausências, pressentimentos,
e de longe nos observa.
Somos intrusos, bárbaros amigáveis,
e compassivo o deus
permite que o sirvamos
e a ilusão de que o tocamos
Manuel António Pina
Nós, gatos, já nascemos pobres
Porém, já nascemos livres.
Enriquez - Bardotti - Chico Buarque, in Musical Infantil Os Saltimbancos, 1977
fotografia de Boyana Petrova
Fotografia de Daniel Mordzinski
No início, Deus criou o gato à sua imagem.
E achou que estava bem.
E de facto estava mesmo bem.
Mas o gato era preguiçoso,
Não queria fazer nada.
Então, alguns milhares de anos mais tarde, Deus criou o homem,
Com o fim único de servir o gato,
De ser seu escravo até ao final dos tempos.
Ao gato, Deus tinha dado a indolência e a lucidez;
Ao homem, concedeu a neurose, o dom da bricolage e a paixão do trabalho.
E o homem entregou-se-lhes alegremente.
Durante séculos, ergueu uma civilização toda baseada na invenção,
na produção e no consumo intensivos.
Civilização com uma única e secreta finalidade:
proporcionar ao gato conforto, morada e abrigo.
Jacques Sternberg, tradução da arcadajade